Hora da decisão

Brasil amplia a exportação, mas falta infra-estrutura
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O Brasil, liderado pelo Rio Grande do Sul, deve bater em 2008 novamente o seu recorde nas exportações de arroz. A Conab prevê venda externa de 700 mil toneladas do cereal, o que levará o país a entrar no rol dos 10 maiores exportadores do mundo. Assim inverterá a balança comercial do produto, após mais de 15 anos como um dos maiores importadores, com internação média anual superior a um milhão de toneladas. 

Com esta atuação, o país posiciona-se estrategicamente no mercado internacional e consolida importante estabilidade nos preços internos. Confirmado este de-sempenho, o Brasil colherá dividendos importantes. Pela primeira vez em sua história recente poderá vender mais do que comprar arroz de outros países. No setor, esta é a expectativa para o ano safra. O esforço exportador iniciou há cinco anos, garantindo importante posição de fornecedor de arroz quebrado para a África. Esta posição está consolidada graças à boa qualidade do produto. 

O Brasil deu um passo à frente nos dois últimos anos para agregar valor às exportações e torna-se importante referência na venda internacional de arroz parboilizado. “No caso do branco, a oferta e a concorrência são maiores, principalmente pela ação dos Estados Unidos, Uruguai e Argentina e a Ásia, players tradicionais”, explica o diretor comercial do Irga, Rubens Silveira. O presidente do Sindicato da Indústria de Arroz do Rio Grande do Sul (Sindarroz/RS), Élio Coradini, afirma que o esforço exportador levou a cadeia produtiva a um importante aprendizado. Segundo ele, não é possível planejar o futuro da orizicultura gaúcha e brasileira sem considerar o mercado externo e estabelecer estratégias de ganhar em competitividade. “Colhemos resul-tados positivos a partir de um esforço importante. Ainda estamos plan-tando, apresentando nosso produto no mercado internacional e prepa-rando nossa infra-estrutura interna para sermos mais competitivos”, afirma.

 

Caminho tortuoso

Apesar dos bons resultados colhidos com o ingresso brasileiro no mercado mundial, que entre março e julho de 2008 somou 102,3 milhões de dólares em divisas, um aumento de quase 470% em relação ao ano anterior, há gargalos a serem vencidos para que o Brasil consolide esta posição. Além da burocracia dos portos nacionais e do chamado “custo Brasil” a serem vencidos, dois pontos fracos podem ser rapidamente identificados para a venda externa: a falta de infra-estrutura e logística para os embarques internacionais, que podem ser entendidas em razão do rápido surgimento do Brasil no cenário mundial como fornecedor do cereal. A segunda é o fato de o setor depender de duas ou três tradings para realizar todos os negócios. 

“Este é um processo novo para a cadeia produtiva do arroz. Em breve surgirão empresas do próprio setor e vendas diretas”, considera Rubens Silveira, diretor comercial do Irga. Como mais de 95% das exportações brasileiras passam pelo Porto de Rio Grande, o gargalo que mais preocupa é a logística e a infra-estrutura de exportação de abril a junho. A época é o pico dos embarques de soja, que toma completamente os graneleiros. Como a soja exporta cinco milhões de toneladas e o arroz, até agora, tem um recorde anual inferior a 500 mil toneladas, não dá para comparar. Isso quer dizer que no primeiro semestre, quando os preços internacionais bateram recordes, entre abril e junho, o Brasil perdeu a oportunidade de exportar muito mais, pois não tinha porto para embarcar. E no segundo semestre, que pode ocupar terminais ociosos, os preços caíram. 

O diretor regional da Novel Commodities S/A, Júlio Donidandel, afirma que o arroz brasileiro tem tudo para manter um ritmo crescente de exportação considerando fatores como a oferta interna equilibrada, a boa qualidade do produto nacional e o cenário internacional demandante. “Mesmo com o dólar baixo o Brasil consegue manter um preço competitivo neste momento”, frisa. A empresa, que movimenta dois milhões de toneladas de arroz (base casca) por ano, planeja transferir 30% da originação dos negócios para o Brasil. 

Para o coordenador de outra trade, que prefere não ter o nome citado, o grande problema é que a demanda internacional cresceu rapidamente e o Brasil não está preparado para exportar. “Não há capacidade física para os embarques nos terminais de granéis em determinada parte do ano, pois a soja é prioritária”, explicou. Segundo ele, a tendência é de o país seguir ampliando seu volume de exportação, o que exige melhoras importantes na logística e na capacidade de embarque. “O arroz brasileiro está com um marketing muito positivo lá fora e, apesar de não ter tradição, está consolidando uma posição no mercado, principalmente com quebrados e parboilizado”, frisa.

 

Setor anuncia investimentos em logística

Para não repetir os problemas com os gargalos de exportação no porto a cadeia produtiva está cobrando medidas. Duas notícias importantes chegaram ao setor nos últimos dias: a conclusão das obras de adaptação de um terminal exportador pelo Governo gaúcho e investimentos de até R$ 7 milhões por parte da Termasa/Tergrasa e CCGL na ampliação da capacidade de armazenagem e embarque no Porto de Rio Grande. A Companhia Estadual de Silos e Armazéns (Cesa/RS) reforma no porto uma unidade com capacidade de 60 mil toneladas. Com investimento de R$ 470 mil a estrutura se torna um terminal de embarque. “Este pulmão pode girar cinco vezes a sua capacidade, ou 300 mil toneladas. À medida que o arroz entrar no navio as empresas podem repor no armazém”, explica o presidente da Cesa, Juvir Matuella.

 

Na mão das tradings

A comercialização brasileira de arroz para o mercado externo está toda concentrada na mão das tradings internacionais. Essas empresas detectaram a oportunidade de mercado, têm forte tradição e conhecimento nesta área e promoveram uma expansão, adotando o Rio Grande do Sul como referência no Brasil, a partir das bases que tradicionalmente trabalhavam no Uruguai e, mais recentemente, na Argentina. Essas empresas dão segurança aos negócios, com o suporte burocrático e econômico necessário. Atualmente a indústria entrega o produto no porto e recebe imediatamente. “É carga no porto, dinheiro na mão”, afirma um corretor. 

Ou seja, se o produto ficar 60 dias no porto porque não tem navio, ou por problemas na documentação, é problema da trade. “Temos grandes indústrias e certamente, em algum tempo, estarão habilitadas a exportar, mas ainda não atingimos o estágio de venda direta”, afirma Rubens Silveira, diretor comercial do Irga. A burocracia, a demanda por empresas de logística e principalmente uma carta de crédito de banco internacional são exigências que acabam favorecendo as tradings. Muitas cartas de crédito são frias. Há países e empresas que têm uma lista de bancos com os quais não trabalham, por medida de segurança. “Para a cadeia produtiva este é um momento de descoberta, de conhecimento dessa nova realidade. Tudo é novidade. E a segurança é fundamental. Ninguém está aí para levar uma queda. Um navio de 30 mil toneladas equivale a 21 milhões de dólares. Ninguém pode se aventurar correndo o risco de perder uma soma destas”, destaca Silveira. Alerta que o fato do Brasil estar batendo recordes de exportação não quer dizer que é só jogar o arroz no porto. “Trata-se de um processo complexo, que a cadeia produtiva recém está conhecendo com maior segurança e que demanda diversos esforços e muita cautela”, avisa.

 

FIQUE DE OLHO 

Mesmo sem a melhor estrutura, o Brasil deve exportar 700 mil toneladas, segundo a Conab. As tradings aproveitam a infra-estrutura da Termasa/Tergrasa fora da época de embarque de soja e também estão usando e abusando da criatividade, com embarques nos portos fluviais de Porto Alegre, Estrela e Pelotas, rumo a Rio Grande. Com a grande demanda internacional, soluções foram criadas pela iniciativa privada para não perder a oportunidade de mercado. 

 

 

Produção e comércio mundiais

As novas estimativas da FAO indicam um incremento da produção mundial em 2007 para 657,2 milhões de toneladas de arroz em casca (equivalente a 438,1 milhões de toneladas de arroz branco). As projeções para 2008 indicam uma nova alta de 1,4% para 666,4 milhões de toneladas (444,3 milhões de toneladas na base arroz branco). 

Com a inflação dos preços mundiais, o comércio mundial em 2008 poderia se situar em 29,7 milhões de toneladas, contra 31,3 milhões em 2007. Quanto a um possível aumento das áreas arrozeiras, estimulado por preços mais altos, estas poderiam ser factíveis somente a partir da safra 2008/2009. Os estoques mundiais terminados em 2007 foram estimados em 105,6 milhões de toneladas, contra 105,1 milhões em 2006. Em 2008 os estoques devem se manter em torno de 106 milhões de toneladas. As informações são de Patrício Mendez del Villar, do Cirad e InfoArroz. 

 

 

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