Microrganismos benéficos para a cultura do arroz


Figura 1. Sistema radicular do arroz oriundos de sementes tratadas (F) com Azospirillum sp. e sem tratamento com microrganismos (G).

Conhecido tradicionalmente como arroz de sequeiro, o arroz de terras altas, por ser a cultura mais indicada e adaptada à abertura de área, atingiu 6,5 milhões de ha de área plantada durante as décadas de 1970/80, período de plena expansão das fronteiras agrícolas no cerrado brasileiro. Hoje, a cultura do arroz de terras altas representa uma opção sustentável e rentável para compor o sistema de produção de grãos no Centro-Oeste. Mas o que mudou para o arroz se tornar esta opção?

A Embrapa Arroz e Feijão vem ao longo de sua existência desenvolvendo inovação tecnológica sustentável para o cultivo de arroz (terras altas, irrigado tropical e subtropical). Podemos dizer que em seus 48 anos de pesquisa a unidade entregou para o mercado cultivares geneticamente melhoradas, que possuem grão tipo agulhinha, ciclo precoce e alto potencial produtivo. Aliadas às novas cultivares, as inovações dos manejos fitotécnico e fitossanitário fortalecem a sustentabilidade desta cultura. Uma das inovações é a utilização de microrganismos benéficos.

Para a cultura da soja, a prática de utilização de inoculante já se tornou uma realidade exemplar para o sistema de produção da soja, possibilitando a redução no uso de fertilizantes, em especial do nitrogênio. Essas foram tecnologias desenvolvidas pela Embrapa, com destaque para as pesquisadoras Joana Dobereiner e Mariângela Hungria. Entretanto, os resultados da utilização dos microrganismos benéficos no cultivo do arroz são recentes e já podemos contar com um leque de opções importantes graças a projetos inovadores desenvolvido por equipes multidisciplinar.

Esta inovação para a cultura do arroz de terras altas vem sendo investigada desde o ano de 2007 por meio de projetos de pesquisa coordenado pela Embrapa Arroz e Feijão, em parceria com a UFG, Emater-GO, UEG, Ufra, Embrapa Clima Temperado, Embrapa Meio Ambiente, Embrapa Roraima, que realizou bioprospecção de microrganismos prósperos para o controle das doenças do arroz.

Como resultados preliminares dessas parcerias, concluiu-se que os isolados selecionados de fungos e bactérias benéficos mostraram-se eficientes para o controle de até 90% das doenças do arroz, em caso de vegetação, e a partir de 50% em condições de campo.

Para a surpresa da equipe, os mesmos isolados que se mostraram promissores para o controle das doenças também foram eficazes na promoção de crescimento (principalmente o arranque inicial), na solubilização de nutrientes, tais como fósforo e zinco, na produção de fitôrmonios e sideróforos e na mitigação dos efeitos do déficit hídrico.

Os resultados obtidos com a interação dos microrganismos benéficos e a planta de arroz trouxeram sustentabilidade ao sistema, principalmente para fazer frente aos desafios impostos pela natureza ao cultivo de arroz de terras altas no cerrado brasileiro.

Entre eles, podemos citar o arranque inicial da planta em plantio direto, ocorrência de doenças, a indisponibilidade de nutrientes, como o fósforo, e a ocorrência de veranicos.

Adicionalmente, no cenário de uma agricultura sem inovação sustentável, muitos agricultores, para romper com os empecilhos impostos pelos desafios da natureza, calendarizam e excederam-se na aplicação de fertilizantes e agrotóxicos, gerando resíduos, colocando em risco o ambiente e a qualidade dos grãos, além de diminuir a rentabilidade da lavoura, e ainda construindo uma planta frágil e desbalanceada nutricionalmente, maximizando os efeitos dos estresses bióticos (doenças, insetos pragas e plantas daninhas) e abióticos (deficiência hídrica, toxidez e deficiências nutricionais).

Dessa forma, o uso de microrganismos benéficos para proporcionar melhor desenvolvimento das plantas de arroz e menor incidência de doenças contribuirá de forma contundente para o desenvolvimento sustentável dessa cultura.

Em trabalhos de pesquisa coordenados pelo pesquisador Adriano Nascente, juntamente com a pesquisadora Marta Cristina Corsi de Filippi e equipe, foi possível observar que o tratamento das sementes de arroz com a bactéria azospirillum sp. proporcionou incrementos significativos no desenvolvimento radicular das plântulas quando comparados com o tratamento controle, sem o uso de microrganismos (Figura 1).

Em outros trabalhos de pesquisa coordenados pelo mesmo pesquisador, foi possível constatar que os microrganismos proporcionaram aumentos significativos na produção de biomassa da parte aérea, de raiz e total (Tabela 2), bem como nos componentes de produção e produtividade de grãos da cultura (Tabela 4).

Dois outros exemplos, coordenado pela pesquisadora Marta Cristina Corsi de Filippi, juntamente com a equipe de fitopatologia da Embrapa Arroz e Feijão, e executado por alunos do Programa de Pós-graduação em Agronomia da UFG (Universidade Federal de Goiás), provam que os bioagentes são eficientes quando inseridos no manejo integrado da brusone.

O primeiro exemplo mostra dados obtidos para o controle da brusone tanto foliar quanto da panícula em condições de campo. O controle dessa enfermidade ocorre, basicamente, por meio da aplicação de fungicidas.

Métodos de controle, como a aplicação de rizobactérias promotoras de crescimento, podem ser inseridos no manejo integrado da brusone.

Formulações líquidas contendo Burkholderia cepacea (BRM 32111) e Serratia marcenses (BRM 32113) foram testadas para a eficiência da supressão da brusone nas folhas e nas panículas em condições de campo.

Os ensaios foram conduzidos na Embrapa Arroz e Feijão entre dezembro de 2018 e abril de 2019, e os tratamentos consistiram no tratamento de sementes e pulverizações aos 14 e 21 dias após o plantio com: formulação 11 + BRM 32113; formulação 20 + BRM 32.111 e controle absoluto (água).

Todos os tratamentos foram eficientes na supressão da brusone das folhas (Figura 2) e das panículas e observou-se aumento de 481 e 427 kg ha− 1 na produtividade, respectivamente (Oliveira et al., 2020).

Figura 2. Severidade de brusone nas folhas em plantas tratadas e não tratadas com as rizobactérias BRM 32111 e BRM 32113. Ano 1, as avaliações foram realizadas aos 57, 58, 64 e 67 dias após o plantio; Ano 2, as avaliações foram realizadas aos 22, 25, 34 e 41dias após o plantio, utilizando uma escala diagramática (Oliveira et al., 2020).

O segundo exemplo mostra os resultados da interação entre os bioagentes e a adubação silicatada. O ensaio conduzido em condições campo, em duas áreas distintas: Fazenda Capivara, em Santo Antônio de Goiás – Goiás e, Fazenda Palmital, em Brazabrantes –Goiás, durante a safra 2015/2016, avaliou o efeito da adubação silicatada em interação com bioagentes na supressão da brusone e no aumento da produtividade, no cultivo de arroz de terras altas.

Os 5 tratamentos consistiram na presença de bioagentes [1 – controle (sem bioagentes), 2 – Burkholderia cepacea, 3 – Serratia marcensces, 4 – Mix de isolados de Trichoderma asperellum, 5 – mistura dos três bioagentes]. Todos os tratamentos foram testados com e sem adubação silicatada (2, 4 e 8 ton ha-1 de SiCaMg ).

Os bioagentes foram aplicados em três momentos diferentes: via semente (todos os bioagentes); via pulverização foliar com B. cepacea, aos 15 dias e; via sulco de plantio com S. marcenses e T. asperellum, aos 15 dias. Utilizou-se a cultivar BRS Primavera CL e avaliou-se: severidade da brusone foliar e nas panículas, biomassa, teor de silício foliar e produtividade.

As doses 2, 4 e 8 ton ha-1 de SiCaMg e a mistura dos bioagentes e S. marcenses isoladamente se destacaram apresentando maior supressão de brusone foliar e nas panículas, incremento na biomassa, maior teor de silício nas folhas e aumento da produtividade (Tabela 3), em uso isolado e/ou em combinação com a adubação silicatada.

O uso de bioagentes e do silício são alternativas eficientes no controle da brusone e aumento da produtividade.

Os resultados indicam que as rizobactérias formuladas têm potencial para serem incluídas no manejo integrado para controle da brusone em lavouras de arroz.

Atualmente, a Embrapa Arroz e Feijão dispõe em sua coleção de Microrganismo, cuja curadoria está sob a responsabilidade da doutora Adriane Wendland, de 300 isolados entre fungos e bactérias benéficas.

Entre estes, existem isolados dos gêneros Burkholderia, Serratia, Bacillus, Trichoderma e Phanerochaeta, ativos que encontram-se disponíveis para serem finalizados em produtos biológicos, parcerias entre a Embrapa Arroz e Feijão e empresas privadas, para que sejam entregues à sociedade.

A utilização de microrganismos benéficos representa hoje inovação tecnológica sustentável não só para a cultura do arroz, mas para diversas culturas agrícolas que compõem os sistemas de cultivo.

Esta inovação representa um marco no cultivo do arroz de terras altas, elegendo esta cultura importante no equilíbrio de sistemas agrícolas.

Adriano Stephan nascente
Eng. Agrônomo, Doutor em Agronomia, pesquisador embrapa arroz e feijão

Marta Cristina Corsi de Filippi
Eng. Agrônomo, Doutora em microbiologia e patologia de plantas,
pesquisadora embrapa arroz e feijão

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