Na crista da onda

 Na crista da onda

Cotações seguem altas apesar dos revezes ao longo da cadeia

A demanda gerada pelo consumo e a antecipação de compras de arroz desde março de 2020, provocadas pela pandemia, deram suporte à elevação mais expressiva de preços do arroz na última década. O Brasil e o Mercosul, que colhiam uma ótima safra, surfaram na crista da onda, entre outras coisas, porque outros fatores conjunturais colaboraram para criar a “tempestade perfeita” em favor da elevação das cotações da matéria-prima no mundo todo e vários países buscaram o bloco econômico para se abastecerem.

De tomador, em semanas o arrozeiro tornou-se formador de preços, referência, e passou a poder determinar quando e por quanto vendia. Isso até junho de 2021, quando as cotações começaram a enfraquecer em razão da ótima safra, das importações e da demonstração global de que não faltaria arroz para abastecer o mundo. Outros fatores ajudaram a consolidar as posições brasileiras para aquela que foi a segunda maior temporada de exportações. O câmbio, o transporte competitivo, a qualidade de grãos, a disponibilidade.

“Em boa parte do ano passado, até o início de 2021, o mercado vinha compensando em competitividade o arroz brasileiro pela desvalorização da moeda nacional perante o dólar, e a cadeia produtiva soube aproveitar bem isso externa e internamente, recuperando uma década de valorização menor que a inflação e agregando alguns ganhos. Foi um período de ótima condição competitiva no mundo”, explica Tiago Barata, diretor do Sindicato da Indústria do Arroz do Rio Grande do Sul (Sindarroz/RS).

Segundo ele, a elevação da qualidade logística e atuação das tradings e indústrias ajudaram muito a alcançar volumes substanciais de embarques. “Para a tempestade ser perfeita, o Brasil havia exportado mais de três milhões de toneladas de arroz nas duas temporadas anteriores, fundamental para mudar um cenário de excedentes acumulados. O Brasil carregava os estoques do Mercosul. Hoje, são estoques privados e boa parte sob gestão do produtor”, explica. A profissionalização do agricultor também na gestão da oferta é apontada como uma das razões desse comportamento de preços, em especial para mantê-los remuneradores ainda em 2021 e depois de uma grande safra, quando, historicamente, há depressão dos valores de venda.

Gestão da oferta ancora as cotações

Se em 2020 e no primeiro semestre de 2021 os fatores que determinam os preços do arroz ao longo da cadeia produtiva sopraram a favor do setor produtivo, o segundo semestre pode ser mais turbulento, com uma tendência mais forte de reversão do cenário. O conceito é baseado em diversos indicadores conjunturais. Os preços internacionais reverteram os valores muito altos do ápice da pandemia, o transporte subiu até 700% para fretes do Brasil, a safra foi grande no país e no Mercosul, o câmbio não é tão favorável, as cotações domésticas não ajudam na competitividade das externas, o consumo voltou aos patamares anteriores à pandemia e os estoques brasileiros são significativos.

Até o fim de agosto, os preços seguem remuneradores, mas a preocupação do agricultor não é dirigida ao curto prazo, mas com a relação de custos x preços de setembro para frente, pois a elevação dos custos, do crédito e a um estoque de passagem alto tornam-se fatores de risco. O que mantém as cotações elevadas é a contida gestão de oferta, pois rizicultor tem o estoque na mão e define o momento e o valor de venda. A valorização da soja e do boi foram fundamentais para construir esse poder de barganha.

Mas a pressão em carregar um estoque muito grande, com menor escoamento doméstico e exterior, voltará, segundo analistas, a impactar as cotações novamente. O diretor executivo do Sindicato das Indústrias do Arroz do Rio Grande do Sul (Sindarroz/RS) Tiago Barata, considera que a determinação do futuro do mercado está na mão dos produtores. “A depender do comportamento de oferta, serão definidas as referências de mercado. Há muitos fatores que, hoje, pressionam o valor da matéria-prima, desde o volume de safra até o escoamento abaixo do esperado”, reconhece.

Por outro lado, destaca que as características do arrozeiro e das propriedades agora são diferentes de 15 anos atrás. “A gestão é profissional, estão rentabilizados, diversificaram o portfólio de produtos e têm o investimento planejado e a inovação como regra. Plantar soja em terras baixas não é mais um mistério e a tomada de decisão tem maior flexibilidade do ponto de vista agronômico e econômico”, observa Barata.

Para Alexandre Velho, presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), o grão mudou de patamar de preços e as cotações podem oscilar pelo câmbio e estoques, mas não há espaço para uma queda substancial, “até em função do custo de produção, que subiu escandalosamente”, aponta. Para ele, há indicativos de crescimento econômico do país e possibilidade das exportações serem retomadas. A área plantada na próxima safra deve ser menor. “O custo e a água são limitantes, e haverá mais interesse na soja em terras baixas”, projeta.

Fique de olho

Para Tiago Barata, do Sindarroz/RS, nos próximos meses será vital que o agricultor entenda que “o ótimo é inimigo do bom”. O mercado do arroz vai evoluir à medida que as pessoas consumam o grão no país, que as exportações ocorram e haja consciência de que preços muito elevados inviabilizam as vendas e atraem fornecimento de outros países. Ele considera que a cadeia produtiva brasileira tem tudo para ter um bom desempenho em 2021.

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