Questão de crédito

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Luz: oportunidade e estratégia

Crédito da indústria muda perfil da comercialização
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Nas últimas safras, novos componentes foram agregados ao já complexo sistema de comercialização do arroz em casca. Primeiro a soja produzida nas várzeas, cuja venda na safra – ou antecipada – deu a uma parte dos agricultores a oportunidade de segurar a oferta do arroz até o segundo semestre para negociá-lo mais valorizado. A quebra na colheita 2015/16, porém, consolidou a presença de novo item na formação dos preços: o crédito direto da indústria. Novo pelo volume envolvido, pois o hábito é tão antigo quanto a própria lavoura.

Extraoficialmente, estima-se que entre 40% e 50% da lavoura gaúcha (de 440 a 550 mil hectares) seja cultivada por este sistema, enquanto apenas um terço das áreas seria coberto por custeio oficial. Com o crescimento do modelo de crédito, algumas empresas criaram departamentos específicos para tratar dos financiamentos, cobranças e contratos. Com a iniciativa, o segmento industrial assumiu um risco parcial, mas conseguiu agregar vantagens à atividade: ganha com a cobrança dos juros e na quantidade de matéria-prima que recebe. Além disso, pode antecipar em seis meses seu planejamento, determinar as variedades de arroz que serão plantadas e quando receberá o produto e tem a garantia do volume de matéria-prima.

O arrozeiro consegue o dinheiro para plantar, pode quitar em produto e mantém o negócio, mas fica preso ao contrato, paga mais juros, entrega o arroz quando vale menos e perde o poder de barganha.

Para Antônio da Luz, economista da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul), o método ajuda os agricultores a se manterem no setor, é uma relação comercial e uma oportunidade que a indústria soube aproveitar. Mas entende que tem defeitos: “O ideal seria travar o preço quando o acordo é formalizado, como acontece em outras culturas”, acrescenta.

Jogo a favor

Em geral, no sistema de financiamento das lavouras, grandes empresas com crédito de sobra tomam o valor nos bancos e repassam aos produtores mediante taxas de 2% a 3% ao mês e garantias flexíveis e recebem em produto.

“É preocupante pensar que este sistema permite, por exemplo, que a indústria receba a saca por R$ 40,00 e venda em casca quatro meses depois por R$ 48,00 para o centro do país sem o custo da industrialização, mas sem gerar empregos, renda, tributos…”, diz Antônio da Luz, da Farsul.

Ele enfatiza que nada disso é ilegal ou imoral: “É uma estratégia de mercado que joga a seu favor a relação entre oferta e demanda. Assim, como quando os preços estavam a R$ 50,00 o arrozeiro não se dispôs a vender por R$ 45,00, agora que está em R$ 40,00 a indústria não tem obrigação nenhuma de pagar R$ 45,00. A empresa que paga R$ 38,00 é a mesma que paga R$ 50,00 se o mercado sinalizar neste sentido. Então, apesar de algumas situações que são dramáticas, o setor precisa fazer uma leitura mais fria e estratégica do momento. E aprender com isso”, argumenta o especialista da Farsul.

Antônio da Luz explica que é também por essa situação do financiamento que as empresas encontraram-se numa posição confortável para negociar na safra e não precisaram ir ao mercado agressivamente por causa dos baixos estoques. “Elas sabiam exatamente quando e quanto arroz ia entrar nos seus silos, se planejaram e agiram para isso. Com importações e estoques, a indústria já entrou desde setembro/outubro comprada, aproveitando alguma oportunidade de mercado sem que os arrozeiros se dessem conta”, resume.

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