A solução é a reforma tributária!

 A solução é a reforma tributária!

Ex-governador gaúcho Germano Rigotto defende a reforma fiscal do país
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O impacto da guerra fiscal na cadeia produtiva do arroz do Rio Grande do Sul é tema que o ex-governador gaúcho Germano Rigotto, hoje consultor na área tributária, conhece bem. A solução, segundo ele, seria a reforma tributária, prometida desde o governo Fernando Collor, no país, e que vem sendo adiada desde então. “O sistema tributário brasileiro é um dos mais complexos e irracionais do mundo, mas existem setores que se beneficiam da situação”, revela. Nesta entrevista exclusiva para Planeta Arroz, Rigotto fala sobre as alternativas para proteger a produção orizícola  e defende a criação de alíquota de ICMS única em todo o país no lugar da absurda quantidade de tributos.

Planeta Arroz – O senhor foi indicado pelo presidente Lula, em 2008, para coordenar, no Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, a reforma tributária.  Por que o trabalho não avançou e ainda continua sendo adiado pelo governo?

Germano Rigotto – Na verdade, o processo começou quando fui presidente da Comissão de Reforma Tributária no governo FHC. Percorremos os 26 estados da federação, falamos com todos os segmentos, fizemos palestras pelo Brasil inteiro com entidades de empregadores e representantes do setor rural. Este foi o grande momento da reforma tributária no Brasil, mas o governo FHC não quis fazer. Aí veio o governo Lula, que aproveitou a maior parte do que havíamos produzido e apresentou o projeto ao Congresso Nacional. Infelizmente, a questão esbarrou nas mesmas resistências conservadoras e, às vezes, corporativas de setores da área econômica que, temendo perder receita, fizeram com que não houvesse nenhuma decisão política efetiva para fazer a reforma. Se houvesse, com o respaldo que o presidente Lula tinha no Congresso, acredito que teríamos avançado. Atualmente, o projeto está parado.

Planeta Arroz – Existe alguma expectativa de mudança no posicionamento do Congresso a partir do governo da presidenta Dilma?

Germano Rigotto – O governo diz que não avançará na reforma como um todo, mas em pedaços. Deverá ser encaminhada ao Congresso uma proposta de desoneração da folha e mais alguns pontos que evitem a guerra fiscal, principalmente na questão dos importados, que hoje são incentivados por alguns estados e, consequentemente, prejudicam a produção nacional. Serão feitas mudanças pontuais no sistema, algumas boas. A desoneração da folha de pagamento, de 20% para 14%, por exemplo, é parte da nossa proposta que está parada.

Planeta Arroz – A reforma tributária é a solução para acabar com a guerra fiscal entre os estados?

Germano Rigotto – Sem dúvida. Hoje a guerra fiscal está aumentando e criando situações como essa no Rio Grande do Sul, que é produtor de arroz e acaba prejudicado por ações dos estados que não produzem. No caso do arroz, o impacto da guerra fiscal é negativo porque temos um tratamento diferenciado para o grão importado em relação ao que produzimos. Estados que não produzem arroz incentivam e desoneram a importação. Por isso há uma preocupação do governo em organizar isso e limitar a guerra fiscal nos produtos importados.

Planeta Arroz – Isto ocorre porque dentro do país temos alíquotas diferenciadas entre os estados?

Germano Rigotto – Exatamente. Temos 27 legislações de ICMS. Cada um dos 26 estados e o Distrito Federal tem a sua própria legislação. Essas legislações são complexas e diferentes umas das outras. Essa falta de uniformidade nas alíquotas cria um problema para um estado produtor, como o gaúcho. Minas Gerais e São Paulo, que não produzem arroz, simplesmente zeram a alíquota de ICMS para atrair indústrias que beneficiem lá o produto. Por outro lado, o Rio Grande do Sul, que produz, se zera a alíquota, acaba perdendo enorme arrecadação,  se não zera, perde competitividade.

Planeta Arroz – O senhor foi governador e entrou na guerra fiscal para atrair investimentos para o Rio Grande do Sul através do ICMS. Não é uma incoerência dar incentivo como governador e depois defender uma limitação à guerra fiscal?

Germano Rigotto – É que, se existe um sistema que permite a guerra fiscal, o Estado não tem como não entrar sob o risco de perder investimentos. Foi assim com a duplicação da GM, o Polo Naval de Rio Grande, a instalação da Toyota em Guaíba. Tudo teve incentivo fiscal, porque, se não desse, não atrairia  investimentos. Mas em relação ao arroz, também tomamos medidas de compensação.

Planeta Arroz – Mas a situação agora é bem mais grave, considerando a crise pela qual passa o setor…

Germano Rigotto – É que a guerra fiscal chegou ao limite e não pode continuar. Tem que ter uma única legislação de ICMS para o país. Tem que haver, no máximo, cinco faixas de alíquota. O arroz estaria na alíquota dos produtos essenciais. É o que está na nossa proposta de reforma tributária, isto é, desonerar os produtos essenciais, os alimentos, e fazer com que haja uma alíquota reduzida, mas uniforme, no território nacional. O arroz, produto essencial, teria uma alíquota reduzida, quase simbólica.

Planeta Arroz – Acabaria a alíquota diferenciada por estado?

Germano Rigotto – Exatamente. Essa é a nossa proposta, uma única legislação de ICMS com cinco faixas de alíquota: especial, reduzida, básica, ampliada e seletiva. Os bens e serviços estariam dentro desta faixa de alíquota. Mas, por exemplo, se o arroz está na alíquota especial, todos os estados vão ter a mesma alíquota, sem  diferenciação em cada unidade da federação. Temos que acreditar que, fora de uma reforma tributária, não vamos conseguir frear a guerra fiscal que prejudica os estados produtores. Ao mesmo tempo, temos que encontrar alternativas para proteger a produção e permitir que tenhamos no Rio Grande do Sul o beneficiamento do próprio arroz. Se não vamos perder empresas para outros estados em função das vantagens oferecidas, então esse processo de agregar valor ao que produzimos é importante. Não podemos é produzir arroz e mandar para ser beneficiado em outro estado. Hoje a situação da guerra fiscal penaliza as empresas gaúchas.

Planeta Arroz – Foi dito na Abertura da Colheita do Arroz, em Camaquã (RS), que a reforma tributária não sai antes de uma reforma política. Existe essa dependência?

Germano Rigotto – Na verdade, as duas poderiam sair juntas. A reforma política, como está caminhando no Congresso Nacional, não vai facilitar que a reforma tributária aconteça. A reforma política, com as mudanças pontuais que vão acontecer no sistema eleitoral e no sistema partidário, traz questões de efeito de longo prazo. O problema da reforma tributária é um sistema no qual o governo federal concentra nos cofres da união 70% de tudo o que arrecada. O dinheiro passeia por estados e municípios, se perde na corrupção, no fisiologismo, então não temos a boa utilização dos recursos públicos em uma federação com as distorções que tem a nossa.

Planeta Arroz – Vai demorar?

Germano Rigotto – O projeto que está no Congresso prevê a substituição dos tributos sobre bens e serviços (ICMS, IPI, PIS, Cofins, Cide-Combustíveis) por dois impostos incidentes sobre o valor adicionado, o IVA, um estadual e um federal. Ele funde o Imposto de Renda Pessoa Jurídica com a contribuição sobre o lucro, desonera a folha de pagamento de 20% para 14%, estabelece uma única legislação de ICMS e cria cinco faixas de alíquota, em vez das mais de 40 que nós temos, com uniformidade entre os estados. É um sistema de fácil fiscalização, que desonera a produção e os produtos essenciais, mas ao mesmo tempo garante uma ampliação da base tributária com menos sonegação e menor informalidade. A proposta, se não é perfeita, ainda pode ser aperfeiçoada, mas parou no Congresso Nacional, e o arroz paga por isso.

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