Porteira aberta para o arroz do Mercosul

 Porteira aberta para o arroz do Mercosul

Cogo: câmbio desfavorável e carga tributária fazem a diferença

Concorrência dos hermanos é dura no mercado brasileiro
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Ao mesmo tempo em que busca ampliar seu espaço no mercado internacional, o arroz brasileiro vem enfrentando em casa uma dura concorrência com o cereal produzido nos países do Mercosul. Enquanto as exportações brasileiras do grão (em casca) passaram de 53 mil toneladas, em 2004, para 420 mil toneladas, em 2007, as importações, principalmente do Uruguai e da Argentina, registraram uma média de 1,1 milhão de toneladas nos últimos 10 anos. Para 2008, a expectativa gira em torno de um milhão de toneladas, mas este volume, de acordo com o analista de mercado Carlos Cogo, da Carlos Cogo Consultoria Agroeconômica, poderá ser ainda maior porque a área plantada nestes dois países está crescendo. 

Tomando como base a última década, Cogo explica que as importações brasileiras de arroz do Mercosul tiveram seu ápice em 1998 (dois milhões de toneladas). Posteriormente registraram um decréscimo até 2002 e voltaram a crescer em 2003 (1,6 milhão de toneladas). A partir desse período sofreram uma breve retração (800 toneladas em 2006), até atingir em 2007 o volume de 1,038 milhão de toneladas. 

Mas como explicar esse “derrame de arroz” em um ano em que a média de preços não chega a R$ 23,00? De acordo com o analista, é o câmbio que acaba tornando países como o Uruguai e a Argentina mais competitivos que o Brasil. “Esse preço dolarizado é muito alto. No Brasil, mesmo que a gente trabalhe com a média de R$ 23,00 e dólar a R$ 1,75, o preço médio vai variar entre 11,20 dólares e 13 dólares ao ano. Com essa base de preço estes países não conseguem exportar o equivalente a um saco de 50 quilos. Considerando esses preços e a ausência de tarifa de exportação de lá para cá, é vantagem para estes países concentrarem suas vendas externas no mercado brasileiro”, avalia Cogo. 

Fique de olho
Além do câmbio, outro fator de desequilíbrio nesta balança permanecem sendo os custos de produção, que são mais baixos em relação ao Brasil. Mas este quadro, segundo o consultor, também já apresenta mudanças: “Em países como Uruguai e Argentina existe realmente um diferencial de custos, os tratores são mais baratos, as taxas são menores, os defensivos pagam menos tributos, que já chegaram a ser até 30% menores em alguns casos. Hoje esta diferença é bem menor, principalmente porque a produtividade média brasileira (por unidade produzida e não por hectare) cresceu muito nos últimos anos, o que acaba reduzindo os custos”, analisa. 

Outro aspecto que tem chamado a atenção dos especialistas é a mudança no perfil das exportações brasileiras de arroz em relação ao Mercosul. “No início da década, a maior parte das importações era do cereal em casca, posteriormente beneficiado no Rio Grande do Sul. Hoje, o Brasil importa muito mais arroz beneficiado do que em casca, sobretudo porque as empresas de lá têm preferência por enviar um produto com maior valor agregado”, destaca o consultor. O mesmo vale, segundo ele, para as empresas daqui, que compram o arroz já beneficiado ou empacotado e colocam a sua própria marca (alguns vêm até com a marca da empresa compradora). Ocorre também uma situação que não havia há alguns anos: a negociação direta entre os exportadores do Mercosul e o varejo brasileiro.

Fonte: Carlos Cogo Consultoria em Agroeconômica

 

MUDANÇA DE COMPORTAMENTO

O Uruguai consome muito pouco arroz, menos de 10% do que produz, portanto é um efetivo exportador, tendo 90% de sua produção voltada para o mercado internacional (50% para o Brasil). Já a Argentina consome 50% do que produz, dispondo dos outros 50% de sua produção para a exportação. Juntos, ambos os países não chegam a consumir 600 mil toneladas. 

O maior importador brasileiro é o Uruguai. Em 2007 exportou apenas cinco mil toneladas de arroz em casca e 518 mil toneladas de beneficiado. No mesmo período, a Argentina embarcou três mil toneladas em casca e 351 mil toneladas do grão beneficiado.
Em 2003, o Brasil registrou sua mais significativa importação de arroz de outros países que não do Mercosul: 682 mil toneladas. 

As exportações do Brasil são, predominantemente, para outros países da América do Sul (Venezuela, Peru, Colômbia, Chile), América Central, Irã (que se destaca por adquirir produtos de qualidade) e recentemente a África.

 

ESTOQUE DE GRAÇA

O analista Carlos Cogo também chama a atenção para o círculo vicioso que viraram as relações do Brasil com os países importadores de arroz do Mercosul. “Todos os anos, o Governo Federal dá suporte à comercialização. Como isso ocorre no período do pós-colheita, o Governo alonga a comercialização no mercado interno, o que permite ao produtor não precisar colocar o produto à venda logo após a colheita, ou seja, eles colhem lá e já começam a mandar para o mercado brasileiro, que é o maior comprador. Enquanto isso, o Brasil está estocando o arroz para eles de graça”, argumenta o consultor. 

De acordo com essa lógica, o Brasil acaba “teoricamente” financiando a armazenagem e o carregamento de estoques do Uruguai e da Argentina. “Paralelamente, enquanto a produção flui de lá para cá (os estoques de passagem destes dois países não chegam a 10%), nós somos obrigados a armazenar esse arroz até que os preços reajam”, explica o analista. Ele defende a tese de que enquanto o Governo brasileiro atuar no suporte à comercialização interna (que na verdade, do ponto de vista do produtor e do Governo, é correta), estará dando chance e espaço para o arroz do Mercosul ingressar no país. Enquanto isso, os produtores brasileiros têm que esperar até o fim do ano para o preço reagir e poder colocar o arroz no mercado, com custo para todos, inclusive para o Governo. 

Essa dinâmica, segundo Cogo, impede os preços de evoluírem enquanto não for esgotada a capacidade de venda do produto estrangeiro. Ou seja, retém o estoque do produtor nacional, mas não o do estrangeiro, que quanto mais vende, mais colabora para manter o preço achatado no mercado interno. O grande debate, na ótica do analista, é como acabar com esse círculo vicioso. Como não há perspectiva de uma mudança para esse cenário, pelo menos a curto prazo, as porteiras seguem abertas para entrada do arroz do Mercosul.

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